Em artigo publicado no Correio Braziliense, Mozart Neves Ramos (IAS) fala sobre a contribuição que a neurociência poderá dar à Educação e cita iniciativas, como a Rede Nacional de Ciência para Educação.Os anos 1990 ficaram marcados como a década do cérebro, graças aos novos conhecimentos trazidos pela neurociência. Hoje sabemos que as crianças e os adolescentes não sustentam a atenção da mesma forma que os adultos. E há uma base neurobiológica para isso. Até o início da vida adulta, o córtex pré-frontal, a parte inferior do cérebro, responsável por inibir alguns comportamentos, ainda não está completamente formado. Assim, é mais difícil se manter concentrado em assuntos que, ao menos naquele momento, não parecem tão relevantes. A neurociência tem nos mostrado que na vida adulta contamos com vasto estoque de atalhos mentais que nos permitem pular detalhes. No entanto, ainda temos a capacidade de aprender coisas novas, assim como as crianças.Aprender envolve inúmeras estruturas cerebrais e funções cognitivas. A neurociência e a psicologia cognitiva distinguem mecanismos e habilidades relacionadas a esse processo — atenção, memória de trabalho, emoção, inteligência. Existe também um ritmo biológico para a aprendizagem, em conformidade com o sono, a temperatura corporal, enfim, as condições físicas que permitem que estejamos mentalmente aptos para prestar atenção, pensar, elaborar. Por exemplo, as emoções são fundamentais para a motivação, para a vontade de aprender. Há muito a aprender com a neurociência: o modo como a qualidade do sono influencia a nossa capacidade de armazenar informações, ou ainda como um aluno disléxico pode ter maiores chances de aprender do que no passado.Mas esses novos achados da ciência ainda não chegaram à escola. Não levar esses novos conhecimentos ao professor é o mesmo que não lhe permitir o direito ao conhecimento, tão necessário para fazer cumprir o direito legal da aprendizagem para todos os alunos. Por isso mesmo, o Instituto Ayrton Senna, em parceria com oInstituto de Ciências Biomédicas da UFRJ (ICB), o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino e a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), vem apoiando a estruturação e o desenvolvimento da Rede Nacional de Ciência para Educação (Rede CpE), que comporta mais de 50 importantes grupos de pesquisa de diferentes áreas do conhecimento, unidos pelo objetivo de compartilhar conhecimentos e realizar pesquisas científicas que possam promover melhores práticas e políticas educacionais baseadas em evidências. Trata-se, portanto, de uma rede de cientistas com a missão de realizar pesquisa translacional em Educação, cujo desafio maior é fazer chegar esses novos conhecimentos ao chão da escola.Um dos primeiros atos da Rede CpE foi realizar um amplo censo nacional dos pesquisadores que já atuam na interface entre ciência e educação no Brasil. A etapa seguinte será a construção de uma plataforma digital, de consulta aberta, na qual será possível realizar buscas de temas e de pesquisadores com tais características de atuação. Esse esforço inicial já identificou 25 mil pesquisadores com estudos de potencial aplicação em educação no país, 2.683 perfis altamente produtivos e colaborativos, e 60 grupos de pesquisas que foram convidados e já fazem parte da Rede CpE, liderada pelo professor Roberto Lent, da UFRJ.Para o próximo biênio 2016/2017, a Rede CpE focará seus esforços em quatro áreas de atuação: (i) alfabetização infantil, fluência leitora e numeração; (ii) competências socioemocionais, aprendizado metacognitivo e tecnologia, em colaboração com o eduLab21 — um laboratório de inovação dedicado à produção e disseminação de conhecimento científico para a melhora da educação pública no Brasil (criado pelo Instituto Ayrton Senna, o eduLab21 é uma rede multidisciplinar de instituições de pesquisa ao redor do mundo, que tem como missão contribuir para que todas as crianças e jovens tenham acesso a uma educação que prepare para a vida no século XXI); (iii) desenvolvimento de estratégias com base científica para a educação de crianças com algum tipo de deficiência, crianças com talentos especiais e portadores de transtornos de aprendizagem; e, finalmente, (iv) investigação do papel de fatores fisiológicos na aprendizagem.Nesse campo da neurociência, não podemos também deixar de destacar o importante papel que a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal vem desenvolvendo para promover a primeira infância no país, apoiando a implementação de políticas públicas para essa fase tão decisiva na vida de nossas crianças. Para um país como o Brasil, com tantos deficits de aprendizagem escolar, esse pode ser um caminho para alavancar os índices de aprendizagem na educação básica, e, por outro lado, um novo espaço de atuação para a ciência e a tecnologia nacionais.*Correio Braziliense – Opinião – 05/05/2016Deixe um comentário Cancelar ComentárioSeu e-mail não será publicadoComentárioNome* E-mail* Site Salvar meus dados neste navegador para a próxima vez que eu comentar.